De Nova Califórnia para o mundo: fruto amazônico fortalece a agricultura familiar através do cooperativismo
- Jorge Damschi
- 6 de jun.
- 4 min de leitura
Cooperativa Reca transforma o cupuaçu em fonte de renda para mais de 300 famílias na Amazônia; safra pode chegar a dois milhões de frutos.
por Loide Gonçalves

Do campo, o sustento brota. O cupuaçu, fruto típico da Amazônia, vai além do sabor marcante que carrega na culinária regional. Ele também representa inovação, geração de renda e esperança para centenas de produtores da agricultura familiar. Nas mãos de tantos cooperados, a economia de Rondônia é movimentada por meio do cooperativismo, como mostra o exemplo da Cooperativa Reca (Reflorestamento Econômico Consorciado e Adensado).
Hoje, o Reca é uma organização formada por pequenos produtores que, ainda na década de 1980, enfrentaram o desafio de estar longe dos grandes centros, com dificuldades de acesso e pouca visibilidade para produtos amazônicos, como o cupuaçu. Mesmo assim, ousaram sonhar e pensar: “Sozinho a gente não vai a lugar nenhum. A gente precisa se organizar de forma comunitária, em conjunto, para que em conjunto a gente possa ter mais força”, lembra Hamilton Condack, presidente da cooperativa, que atualmente reúne mais de 300 famílias de pequenos produtores.
Na época, mesmo com poucos recursos e investimentos, apostaram na castanha, no cupuaçu e na pupunha. Mesmo anos atrás, o fruto já despontava como promissor. “O cupuaçu era, e continua sendo, o nosso principal arranjo dentro dos sistemas agroflorestais”, explica o presidente, destacando o potencial do fruto na criação de subprodutos.
Localizada no distrito de Nova Califórnia, a mais de 350 quilômetros de Porto Velho, a cooperativa conquistou seu espaço e movimenta a região com sustentabilidade. Além de fortalecer a cadeia produtiva, desenvolve projetos de reflorestamento que beneficiam diretamente o meio ambiente e a comunidade.
Mãos que unem
Dirceu José é produtor rural e cultiva o cupuaçu há mais de 30 anos. Natural do Sul do país, se aventurou nas terras rondonienses apostando na produção de açaí, café, palmito e pupunha, mas foi com o cupuaçu que encontrou o melhor retorno financeiro.
“É muito gratificante, importante, né? Não sou só eu que mexo, tem vários produtores, mas todo produtor que mexe com ele [cupuaçu] só tem a agradecer a Deus, que sempre sobra um dinheiro no fim. Eles [Reca] pagam a produção, reajuste, um lucro…”, conta.
Cupuaçu, fruto amazônico, nas mãos de Dirceu José, produtor rural do distrito de Nova Califórnia, em Porto Velho. Crédito: Jonisson Cruz
Com gratidão, Dirceu reconhece o papel do fruto e da cooperativa na sua trajetória como agricultor familiar. “É uma cultura que eu vi, tive conhecimento depois que vim pra cá. No Sul, não tem, né? É uma coisa maravilhosa. Sou muito feliz em trabalhar com o cupuaçu.”
Nesta safra, a ideia é que cerca de 12 toneladas saiam apenas da propriedade de Dirceu. Segundo a Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater), em 2023 mais de 200 produtores de cupuaçu, ligados à agricultura familiar, receberam assistência, gerando uma renda total de R$ 1,6 milhão. Mas, além desses, há produtores, como Dirceu José, que comercializam o fruto diretamente para a cooperativa Reca. Em uma única safra já foram produzidos quase dois milhões de frutos.
Para Gicarlos Souza, gerente comercial do Reca, o crescimento dos resultados está diretamente ligado à forma como a cooperativa se organiza. “A importância de estarmos reunidos de forma cooperativista é que conseguimos beneficiar uma produção em grande escala e gerar valor aos produtos dos sistemas agroflorestais. É uma forma de nos organizarmos e promovermos desenvolvimento para os produtores e para a região”, explica.
Quando a Amazônia vira doce
O bombom regional de cupuaçu já é um sucesso. Feito a partir do fruto, tornou-se item indispensável para quem deseja apresentar o Norte pela culinária. “Sempre que eu viajo para outros estados do país, meus amigos pedem para eu levar o bombom ‘daquele fruto’... Às vezes não lembram o nome, mas sempre lembram do sabor e gostam muito”, conta Rebeca Falcão, porto-velhense de 31 anos.
Na proposta de valorizar o que é da floresta, o Reca tem investido na criação de novos subprodutos: geleias, doces, manteigas voltadas para cosméticos e licores. Mais recentemente, na 12ª edição da Rondônia Rural Show — a maior feira de agronegócio da região Norte — a cooperativa lançou uma novidade especial: o cupulate.
“É um chocolate feito com a amêndoa do cupuaçu. É um produto inovador. As pessoas se surpreendem, acham que chocolate é só de cacau, mas gostam bastante da inovação e do fato de ser um produto orgânico, diferenciado”, explica Gicarlos.
No quiosque da feira, o movimento não parava. Olhares curiosos, sorrisos e elogios confirmaram: a Amazônia pode, sim, virar chocolate — e dos bons.

O amanhã tem gosto de cupuaçu
Há força para transformar frutos em negócios, sonhos em renda e a Amazônia em oportunidade. Do campo à cidade, da amêndoa ao chocolate, o que brota na floresta é muito mais do que um fruto ou um produto: é símbolo de resistência, união e de amor pela terra.
“Na nossa história, a gente fala que os agricultores que vieram do Sul trouxeram essa base do cooperativismo, mas a gente teve a felicidade de encontrar aqui os rondonienses, acreanos e amazonenses que conheciam a floresta e conheciam, de fato, o cupuaçu”, exalta o presidente do Reca.
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